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1/3 O TRÁFICO DE ANIMAIS SELVAGENS

O Brasil é um dos países com a maior biodiversidade do mundo. Esse conceito pressupõe uma interdependência de diversos organismos, sistemas e biomas para estabilidade do ecossistema do país como um todo. Preservar esse equilíbrio, com estratégias que visem à manutenção da fauna e flora, portanto, são substanciais. Entretanto, devido às ações antrópicas como o tráfico de animais silvestres, a segurança da fauna que compõe meio ambiente brasileiro tem sido comprometida. Essa ação é configurada pela retirada de animais de seus habitats naturais e destinação à comercialização, que varia desde a compra ilegal por pessoas para cria-los como “pets” até a distribuição de peles, carne ou partes do corpo, por exemplo.

Diante do reconhecimento da diversidade ambiental brasileira, com a promulgação da Constituição de 1988, foi feita uma das primeiras estratégias a nível legal voltadas para valorização desse patrimônio. Nesse documento é trazido no artigo 225 que: “Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao poder público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações”. (LIMA, 2007). Dessa forma, o tráfico de animais silvestres é tratado como apropriação indevida de patrimônio, pertencente ao poder público e à sociedade. Entretanto, apesar de ser uma constituição com aspectos ambientalistas, reconhecendo a importância vital do meio ambiente ecologicamente equilibrado para saúde única, não houve, nessa época, o estabelecimento de crimes e penas para delitos ambientais.

No ano de 1998, foi promulgada a lei nº 9.605/98, na qual é melhor sistematizada a conduta criminal referente a fauna selvagem. No artigo 29, ela diz: “Matar, perseguir, caçar, apanhar, utilizar espécimes da fauna silvestre, nativos ou em rota migratória, sem a devida permissão, licença ou autorização da autoridade competente, ou em desacordo com a obtida: Pena - detenção de seis meses a um ano, e multa.”. (SILVA, 2018) A legislação elenca os crimes contra a fauna e tipifica algumas das condutas para o tráfico de animais, impondo, porém, penas leves a essa criminalidade, podendo se tornar um instrumento ineficaz para evitar o delito. Além disso, a expressão “tráfico de animais” não existe no ordenamento jurídico brasileiro, somente condutas relacionadas ao delito. Dessa forma, acentua-se a instabilidade e aplicabilidade da legislação vigente e, com a branda penalidade e altos lucros, torna cada vez mais atrativa a modalidade criminal.

No que se refere à estrutura político-administrativa do Estado, os órgãos governamentais responsáveis pela área ambiental estão hierarquicamente organizados, tendo em primeiro lugar o Ministério do Meio Ambiente, encarregado em direcionar politicamente as ações do governo e de normatizar a Política Nacional do Meio Ambiente. Além disso, ele também é responsável por coordenar as ações da Polícia Rodoviária Federal e Polícia Federal na fiscalização, assim como a nível estadual e municipal estão incumbidos os de policiamento militar ambiental. Em segundo plano está o IBAMA, órgão federal responsável em coordenar a execução da política ambiental do país. Também há a corroboração feita por Organizações Não Governamentais (ONGs) nacionais e internacionais no combate ao tráfico, como a RENCTAS (Rede Nacional de Combate ao Tráfico de Animais Selvagens) e a Traffic, por exemplo. (WWF, 1995)

Em última instância, os animais apreendidos pela polícia são encaminhados aos órgãos de triagem e reabilitação mais próximos. Conforme a Resolução INEA Nº 157, de 19 de outubro de 2018, um CETAS (Centro de Triagem de Animais Silvestres) é todo empreendimento autorizado com finalidade de: receber, identificar, marcar, triar, avaliar, recuperar, reabilitar e destinar animais silvestres provenientes da ação da fiscalização, resgate ou entrega voluntária de particulares. Já um CRAS (Centros de Reabilitação de Animais Silvestres) possui fins, preferencialmente, de programas de reintrodução dos espécimes no ambiente natural das espécies nativas resgatadas. (INEA)

Hoje em dia há a possibilidade de criação de espécies de animais silvestres autorizadas pelos órgãos regulamentadores, devendo o cidadão se cadastrar como criador amador, sendo permitido adquiri-las em criadores comerciais que são devidamente cadastrados e licenciados juntos aos Órgãos Ambientais. Entretanto, conforme as últimas movimentações governamentais, foi proposto o Projeto de Lei 4705/20 para proibir o comércio de espécimes da fauna silvestre em qualquer situação exceto de criadouros regularizados que tenham fins conservacionistas ou científicos. Essa atitude, entretanto, se choca diretamente com a característica cultural brasileira de domesticação de fauna silvestre, que é uma importante variável para o tráfico. Essa legislação fomentaria essa prática ilegal, uma vez que se diminuíram as alternativas regulamentadas das quais os cidadãos podem adquirir os animais autorizados.

Apesar da existência das legislações atuais, é evidente a necessidade de revisão, atualização desses documentos, aumento da penalidade, intensificação da fiscalização e especificações cientificamente embasadas e analisadas para desconstrução de suas falhas técnicas. Além disso, é evidente a necessidade de um combate multidisciplinar mais coeso, efetivo e organizado entre os órgãos de apreensão, fiscalização, destinação dos animais e punição, a fim de promover um manejo mais efetivo da situação e controle da criminalidade.


Por: Luiza Esteves Silva





REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

DEL'OLMO, Florisbal; MURARO, Mario. (2018). O TRÁFICO INTERNACIONAL DE ANIMAIS E A PROTEÇÃO DA DIGNIDADE. Veredas do Direito: Direito Ambiental e Desenvolvimento Sustentável. 15. 155. 10.18623/rvd.v15i31.1189.

Costa, Fábio, Renata Ribeiro, Carla de Souza, e Rodrigo Navarro. 2018. Espécies De Aves Traficadas No Brasil. Fronteiras: Journal of Social, Technological and Environmental Science 7 (2), 324-46. https://doi.org/https://doi.org/10.21664/2238-8869.2018v7i2.p324-346.

LIMA, Gabriela Garcia Batista. A conservação da fauna e da flora silvestres no Brasil: a questão do tráfico ilegal de plantas e animais silvestres e o desenvolvimento sustentável. Revista Jurídica da Presidência, v. 9, n. 86, p. 134-150, 2007.

Rev. Jur., Brasília, v. 9, n. 86, p.134-150, ago./set., 2007134 A conservação da fauna e da flora silvestres no Brasil: a questão do tráfico ilegal de plantas e animais silvestres e o desenvolvimento sustentável.

SILVA, Juliana França da. Tráfico de animais silvestres. Direito Net. 01 de maio de 2018. Disponível em: https://www.direitonet.com.br/artigos/exibir/10681/Trafico-de-animais-silvestres. Acesso em: 29 de outubro de 2020.

Tráfico de animais silvestres: o que diz a lei brasileira. Mundo advogados. 25 de fevereiro de 2019. Disponível em: https://www.mundoadvogados.com.br/artigos/trafico-de-animais-silvestres-o-que-diz-a-lei-brasileira. Acesso em: 29 de outubro de 2020.

WWF. Diagnostico do comercio ilegal de animais silvestres no Brasil, considerando os tráficos interno e externo. 1995. Brasília. Disponível em: https://acervo.socioambiental.org/index.php/acervo/document os/trafico-de-animais-silvestres-no-brasil. Acesso em: 29 de outubro de 2020.

Triagem e Reabilitação (CETAS e CRAS). Instituto Estadual do Ambiente (INEA). Rio de Janeiro. Disponível em: http://www.inea.rj.gov.br/biodiversidade-territorio/triagem-e-reabilitacao-cetas-e-cras/. Acesso em: 29 de outubro de 2020.

PL 4705/2020. Câmara dos deputados. Disponível em: https://www.camara.leg.br/propostas-legislativas/2263280. Acesso em: 29 de outubro de 2020.




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